Prefácio
A tese de doutoramento Católicos e Política(1870-1910): o pensamento e a acção do conde de Samodães, defendida na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, por Eduardo Cordeiro Gonçalves, vaza-se nas páginas seguintes. Então como agora, a sua leitura põe em evidência a singular importância do conde de Samodães entre os católicos do Portugal oitocentista e o seu entrosamento pela adesão, pela oposição, pela crítica, pela discussão criativa na história desse século, do qual é figura sinalética, até porque se identifica com a textura do tempo a ponto de quase se apagar quando o mesmo século XIX e o seu espírito se desvanecem na memória dos homens.
Por outro lado, o texto do Doutor Eduardo Cordeiro Gonçalves demonstra raras qualidades de investigador. Com cuidado e paciência, procurou tudo o que era possível pesquisar, o que estava à mão ou descobriu, o sabido e o que alguém lhe indicou a respeito do homem e acerca da sociedade e das ideias que cruzam a época em causa.
O autor ainda mostra qualidades seguras a ordenar e seriar os marcos fundamentais do pensamento e da acção dessa proeminente figura portuense e nacional, durante décadas quase esquecida, ou porque era monárquico, ou porque era católico, ou porque foi um liberal e esteve ligado à fundação do Partido Nacionalista, ou enfim porque a marcha dos anos tragou alguns dos conceitos por ele defendidos. A complexidade do personagem e do tempo, a multiplicidade dos problemas em debate, a sua capacidade de escrever e falar, não fizeram esmorecer o ânimo, a curiosidade e o desvelo inquiridor do Doutor Eduardo Gonçalves. Do mesmo modo, não se insatisfez com os questionamentos a que foi sujeito, com o dever de melhor precisar ou investigar este ou aquele aspecto fora de dúvida ligado à temática que queria esquadrinhar, perceber e dar a conhecer mês a mês, quando necessário, testemunhei este empenho, estas virtudes de quem, com honradez e esclarecida pertinácia, edificou a sua dissertação de doutoramento, cujas qualidades, nas respectivas provas públicas, o bispo D. Manuel Clemente, professor da Universidade Católica Portuguesa, pôs a descoberto usando toda a gama de merecidos encómios. Por mim, aceitei, com prazer, dirigir a dissertação de um antigo aluno, agora professor no Instituto Superior da Maia. Em cada encontro, aprendi um pouco mais, ciente de que o seu trabalho, por via de Samodães, ajuda a compreender vertentes essenciais do nosso século XIX, até há pouco insuficientemente estudadas e, sobretudo, o reverdecer de ideias apontadas pelo conde.
Na verdade, já a I Parte, acerca da Família, formação e acção política do segundo conde de Samodães, subdividida em dois capítulos, um sobre o Tempo de aprendizagem, outro concernente à Política activa (1852-1870), é marcada pela originalidade dos dados biográficos recolhidos e pelo esforço de integração na época. O mesmo se aviva na II Parte, subordinada ao tema , Entre o catolicismo integrista e o liberalismo católico, pois, as observações inéditas marcam o teor do capítulo I a respeito do Conservadorismo e vanguardismo católico. No capítulo II, atinente ao Militantismo do movimento católico, a par do que explica, sobressaem pistas a explorar em estudos próximos, em virtude das interrogações que suscita.
Findando com oportunas conclusões, o trabalho vale pelo que ensina, como pelos caminhos que aponta ou sugere, pelas virtudes que qualificam este livro.
A propósito das fontes e da bibliografia, sublinhe-se a relevância, ambição e cuidado postos na descoberta de publicações e escritos de Samodães, textos que o autor inventariou e leu cuidadosamente.
De que maneira tratou a imensa soma de dados de tão variada natureza, tendo como meta explorar a acção e pensamento de Samodães? Eis o que o leitor descobrirá, lendo o volume com a atenção merecida.
Para mim, repito, foram sempre benéficas as horas de trabalho que a elaboração da dissertação me proporcionou e não menos a sua leitura. A mesma ideia ficou no júri de especialistas que aprovou o candidato por unanimidade.
Pelo que fez e pelo que promete, felicito o Doutor Eduardo Gonçalves, vincando o ingente labor a que se obrigou, com inteligência e clareza, sem olhar a sacrifícios.
Braga, 9 de junho de 2004.
Luís A. de Oliveira Ramos